Hora de voar
Outro dia, durante a leitura com meus alunos de O Pequeno Príncipe pensei na forma como ele nos ensina sobre humildade, aprendizado e escuta. Uma das passagens que sempre me marcou é quando o Pequeno Príncipe encontra o rei no primeiro planeta que visita. O rei se considera um governante absoluto, mas, no fundo, suas ordens só são dadas quando têm sentido. Quando o príncipe boceja, ele lhe ordena que boceje, e quando ele para, o rei lhe pede que boceje de novo. Ou seja, suas "ordens" são apenas adequações à realidade, e ele, na verdade, não tem o controle que pensa ter.
Essa cena me faz pensar sobre como, muitas vezes, resistimos a ser corrigidos. Achamos que já sabemos o suficiente, que nossa posição—seja na igreja, no lar, no trabalho—nos dá um certo direito de não sermos exortados. Mas a verdade é que ninguém está acima do aprendizado. O Pequeno Príncipe, ao longo de sua jornada, encontra personagens que representam aspectos da humanidade: o vaidoso que só quer elogios, o bêbado que foge da realidade, o empresário que se orgulha de possuir coisas que não pode usar... Todos, de alguma forma, se fecham para algo essencial: a humildade de reconhecer erros e aprender.
Na vida cristã, esse ensinamento é fundamental. A Bíblia nos lembra que Deus corrige aqueles a quem ama (Hebreus 12:6) e que a exortação é um ato de amor. Mas será que sabemos receber isso? Muitas vezes, queremos ouvir apenas o que nos agrada, o que confirma nossas próprias ideias. No entanto, o verdadeiro crescimento vem quando aceitamos ser corrigidos—quando permitimos que Deus, através da Sua Palavra e até mesmo de pessoas ao nosso redor, nos molde e nos conduza à maturidade.
Muitas vezes, nosso orgulho nos impede de receber correção e, ao mesmo tempo, nos faz julgar com severidade aqueles que erram. O Pequeno Príncipe nos ensina que é possível olhar para os outros com um olhar de compaixão e compreensão, sem, contudo, ignorar os erros. Ele não tenta mudar à força aqueles que encontra, mas faz perguntas, escuta e reflete. E essa postura nos desafia: ao invés de reagirmos com dureza, podemos incentivar o crescimento do outro com paciência e graça. Afinal, o próprio Deus nos trata assim—corrigindo, mas sempre com amor. Quando entendemos que todos estamos em processo, aprendemos a equilibrar verdade e misericórdia, exortação e acolhimento.
O Pequeno Príncipe, no fim de sua jornada, entende algo essencial: "Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos." Da mesma forma, muitas das correções que recebemos não são confortáveis, mas são essenciais. Ser exortado não significa ser humilhado, significa ser cuidado. Não importa nossa posição, ainda precisamos aprender, ainda precisamos ser corrigidos, pois só assim crescemos.
Que possamos ter um coração humilde, pronto para ouvir, pronto para mudar. Pois a verdadeira sabedoria não está em nunca errar, mas em reconhecer os erros e permitir que Deus nos transforme.
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Salmo 51:10